sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Viva Marajó - pra quem não conhece

Primavera no Marajó

Volto em uma semana. Se for possível, publico notícias de lá. 

Tomatinhos do quintal

Ainda aqueles tomatinhos. Dá dó de arrancar, mas vontade de comê-los. 

Uma fruteira convencional

Frutas amazônicas mandadas pela Antônia (você pode encomendar, se quiser), trazidas aqui em casa diretamente pelas mãos do José Baratino. Veja que honra. Agora quero comê-las no pé. Pro Marajó eu vou. 


Na cesta, jambo roxa e vermelho, abiu, abricó-do-pará, caimito e um parente do buriti. 

Cará-moela frito dois em um



Ainda consegui salvar uns carás-moelas que já ensaiavam a próxima geração. Tirei com a faca os pedaços com anúncios de brotos e lancei-os à terra. O que restou, cortei em toletes disformes. Tinha do branco e do roxo. Não me saía da cabeça que ficariam gostosos se fossem fritos à moda da dona Neide (não, não eu, aquela das batatas doces fritas com óleo e água). Decisão acertada. 




Coloquei-os na panela com 2 xícaras de óleo frio e meia xícara de água. Deixei no fogo até que a água secasse e os pedaços começassem a dourar no óleo. Não pense que o óleo com a água vai espirrar em você, pois a temperatura do óleo só começa a subir quando não restar mais água. Enquanto ela está ali, cozinhando o cará, a temperatura da mistura se mantém em cerca de cem graus. Acabou a água, o óleo começa a ficar mais quente e aí sim começa a etapa de fritura. Dois em um. 

De vez em quando mexi os pedaços porque queriam grudar um pouco no fundo da panela enquanto cozinhavam. Mas ficaram muito sequinhos, crocantes por fora e macios por dentro. A casca fica um pouco firme para mastigar, mas ainda assim vou sempre mantê-las, afinal são limpas, não são barreiras para agrotóxicos e contribuem com fibras - bom para quem está consumindo frituras, diga-se. Foi só polvilhar com um pouco de flor de sal e uns flocos de pimenta e Nhac!  E cará-moela, agora, só na próxima safra. 

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Revelando São Paulo 2011


Só para não esquecer, algumas fotos do último Revelando São Paulo.

Piquenique de setembro

Notícias e fotos do piquenique aqui e ali

Pãozinho de tapioca. Ou quinta sem trigo 35


Partindo da receita daquele pãozinho de tapioca que comi em Belém e mostrei aqui, quis experimentar fazer com a farinha de tapioca baiana. Antes, vale dizer que tapioca é o nome da goma, do polvilho, do amido da mandioca. Portanto tudo que leva o nome de tapioca deriva deste ingrediente e por isto há tanta confusão na hora de nomear as farinhas de tapioca que adquirem formas diferentes dependendo do lugar - na Bahia, são farinhas beijus (como um beiju de tapioca fininho e esmigalhado), no Acre as bolinhas são disformes e grandes como sagus; no Pará são bolinhas pipocadas e leves e há ainda a tapioca granulada, vendida em São Paulo - pedrinhas duras. E os sagus de mandioca também podem ser conhecidos fora daqui como tapioca (não é produto indígena e pode ser feito com outros amidos, conforme já mostrei aqui). 

Mas eu queira usar a farinha de tapioca de beiju que minha amiga Silvia Lopes trouxe de Salvador. Usei, deu certo, mas quis mexer na quantidade de leite, para ficar ainda mais macio. E cadê mais farinha para comprar? Não encontrei (embora já tenha visto uns flocos grandes de beiju no mercado da Lapa, que também devem funcionar). Então, para que ninguém venha me dizer que não pode fazer os pãezinhos porque não tem um mercado desses por perto ou uma amiga baiana disposta a carregar muambas, resolvi arriscar a fazer em casa a farinha tradicionalmente assada em grandes tachos. Tentei fazer com os pãezinhos com farinha beiju que tem no supermercado, mas não dá certo porque não é farinha de tapioca pura, mas simplesmente uma farinha de mandioca fina assada na forma de beiju, contendo, portanto,  fibras e outros elementos além do amido.  


Bem, o feitio caseiro da farinha deu muito certo e não é nada difícil. Você pode usá-la para fazer o pãozinho e também para fazer uma espécie de granola. Basta misturar com um pouco de coco e açúcar e levar novamente ao forno só para tudo ficar bem crocante. Fica uma delícia para comer com banana. Mas talvez eu volte a este assunto qualquer quinta dessas. 

Você pode me perguntar - ué, se molho 250 g de polvilho para obter 250 g de farinha de tapioca seca que será novamente umedecida, por que não usar simplesmente o polvilho seco? E eu lhe respondo: não é a mesma coisa, tem a ver com a gelatinização do amido que o modifica totalmente - e este é um assunto que caberia no caderno Paladar de hoje (assim como a influência direta da proporção amilose/amilopectina na viscosidade, transparência ou opacidade dos geis feitos com diferentes tipos de amido), mas para isto teriam que dedicar ao assunto mais algumas páginas. 

A farinha de tapioca  - se você não tem nem o polvilho, comece então plantando a mandioca e extraindo o amido (veja aqui). 

Esta farinha de tapioca, minha amiga trouxe de Salvador


Misture 250 g de polvilho doce com 120 ml de água - como se fosse
fazer tapioca. Já mostrei como fazer tapioca aqui











Coloque o polvilho úmido numa peneira e, pressionando com a mão,
espalhe-o sobre uma assadeira fazendo uma camada fina. 
Você vai precisar de mais de uma assadeira. Deixe no forno quente
até secar e trincar (uns 10 minutos)
Basta então recolher os flocos
Minha farinha de tapioca ficou assim 














Com a farinha comprada ou preparada em casa, agora é fácil fazer os pãezinhos que ficam leves, macios e um pouco pegajosos como pães de queijo - quando esfriam perdem esta liga e ficam fáceis de cortar. Mas o bom mesmo é comê-los quentes com café.  Como você pode ver nas fotos, deixei alguns sem nada de cobertura, enquanto nos outros coloquei tudo o que encontrei. Passei no queijo ralado, polvilhei fubá de canjica, empanei em ervas secas ou frescas, erva-doce, flocos de quinua, gergelim, pimenta etc.


No começo, a massa fica mole assim
Depois de uns 20 minutos estará mais firme 
Poderá ser moldado com as mãos
Invente coberturas. Basta passá-los sobre queijo ralado, pimenta, 
gergelim,erva-doce, flocos de quinua, linhaça, endro etc
Nestes não passei nada e num deles fiz um corte com estilete antes 
de assar

Pãozinho de tapioca 

25 g de manteiga em ponto de pomada (2 colheres de sopa rasadas)
1 1/2 xícara de leite (360 ml)
3 colheres (chá) de açúcar
1 colher (chá) de sal
1 ovo 

250 g de farinha de tapioca (mais ou menos 3 xícaras de chá) 
Obs: medidas padronizadas, sempre rasadas

Bata no liquidificador ou misture bem os cinco primeiros ingredientes e despeje sobre a farinha de tapioca. Misture bem, espere uns 20 minutos para hidratar os grânulos (teste para ver se os grânulos estão macios e se a massa tem liga para modelar) e então retire porções com cerca de 35 a 40 g (uma colher de sopa cheia), molde-os com as mãos em bolinhas ou cilindros.  Coloque-as numa assadeira untada e polvilhada com polvilho doce e leve para assar em forno bem quente (200 °C) preaquecido até que dourem, por cerca de meia hora.


Rende: 15 pãezinhos
Fica bem fofinho! 

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A árvore da fruta que não fotografei. Ou: saudade da taiuveira de Fartura

Hoje, dia da árvore, lembrei da taiuveira (Maclura tinctoria) do pasto, lá em Fartura.  Assim que meus pais compraram o sítio, descobrimos duas árvores, uma delas ao pé de uma mata, gigantesca, sem espinhos, boa pras crianças treparem. E nós, adultos, também. Os frutinhos verdes, taiuvas ou  amoras brancas, eram discretos, da mesma cor das folhas, mesmo quando maduros. Sobravam pouco para nós, que comíamos só por divertimento. O resto era comida de passarinho. Doce e leitosa, sem acidez nem aroma muito pronunciado, as taiuvas nos distraiam na caminhada. 


Nunca me preocupei em tirar fotos da árvore nativa, nem do fruto, até começar o Come-se. Também nunca tinha pensado em preparar nenhum prato com as frutinhas. Bastava comê-las. Acontece que quis fazer tudo isto depois de abrir o blog, porque queria mostrar. E todas as vezes que ia a Fartura, visitava a árvore na esperança de conseguir frutos maduros. Ih, a safra acabou na semana passada, dizia meu pai. Ah, os frutos ainda estão cabeludos, lamentava de outra vez. Poxa, já acabou e eu esqueci de guardar pra você, se desculpava ele na próxima visita. E assim foi durante todos estes últimos anos. Nunca mais peguei uma fruta madura. E o sítio foi vendido sem que eu tivesse conseguido fotografar e cozinhar taiuvas. 




Assim como a amora, da mesma família das Moráceas, seus frutos também são compostos (infrutescências) com superfície tuberculada e nunca mudam de cor. Os frutos mostram que estão bons para comer quando estão  graúdos, mais macios, mas nunca moles como as amoras maduras. Infelizmente não há cultivo comercial, mas a planta é encontrada por todo o Brasil. Segundo o livro "Frutas Brasileiras e Exóticas Cultivadas", de Harri Lorenzi e outros, só não é encontrada na Mata dos Pinhais.  De qualquer forma, a gente não costuma ver taiuveiras por aí. Se bem que, com os frutos tão discretos,  às vezes a gente vê mas não bota reparo. E agora que não temos mais a taiuveira de Fartura, guardo na lembrança apenas a foto da árvore de boa sombra e dos frutos verdes e ainda cabeludos que eu usava para assustar as crianças dizendo que eram taturanas. 


E, por falar no livro do Harri Lorenzi, logo no prefácio há um bom causo contado pelo engenheiro agrônomo Carlos Jorge Rossetto. Aqui, um trecho:

Para citar um exemplo ilustrativo, na minha infância, na cidade de Pompéia, interior do estado de São Paulo, eu e outros meninos trepávamos numa tiauveira para comer taiuvas (amora branca). Era uma festa, a meninada no alto da árvore disputava os frutos maduros, grandes e deliciosos. A árvore não era espinhosa, tanto que a meninada subia com muita facilidade, ao contrário das taiuveiras que hoje vejo. Aquela taiuveira era muito produtiva. Frutificava todos os anos em abundância. Nas viagens, sempre que vejo uma taiuveira, faço questão de examinar pra ver se se compara àquela de Pompéia. Nunca descobri uma igual. Nunca mais vi a meninada em cima de uma taiuveira saboreando seus frutos. Já agrônomo, trabalhando como pesquisador no Instituto Agronômico de Campinas, tomei consciência de que aquela taiuveira da minha infância era uma planta excepcional e que eu deveria ir até Pompéia tentar coletar seus frutos e sementes para multiplicá-la e salvá-la.  Viajei de Campinas a Pompeia com esse propósito, mas ela lá não mais estava. Em seu lugar construiram uma casa.

Por um feijão maravilha seguro

Tinha ficado chocada com o artigo do Xico Graziano no último dia 06, no Estadão,  anunciando e louvando a aprovação do feijão transgênico, mas a ignorância às vezes nos condena ao silêncio e, involuntariamente, ao consentimento.  Por sorte podemos contar com especialistas que nos emprestam os argumentos seguros que nos faltam para contestar com razão.  Veja a resposta dos professores abaixo assinados publicada no Jornal da Ciência, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.  Copio na íntegra. É bom divulgar.

JC e-mail 4347, de 20 de Setembro de 2011

Por um feijão maravilha seguro

Artigo enviado ao JCEmail pelos autores, em resposta ao artigo "Feijão maravilha", de Xico Graziano, publicado no jornal O Estado de São Paulo de 6 de setembro.

Segurança é uma noção relacionada com confiança, continuidade, e em matéria da vida todos nós queremos marcar um golaço para termos mais segurança e vivermos em um ambiente sadio. O que queremos realmente é o desenvolvimento do país, com sustentabilidade, e o bem estar da população. O que desejamos é a proteção em relação aos riscos. Daí a noção de biossegurança e a importância do aprofundamento das avaliações dos riscos. Foi aprovado na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) o processo de liberação comercial do feijão transgênico. Uma vez que biossegurança interessa todos, vale a pena então discutirmos a questão de um feijão maravilha seguro!



Respondemos inicialmente a um artigo do Sr. Xico Graziano publicado no Jornal o Estado de São Paulo aos 06.09.2011 intitulado por um feijão maravilha, no qual ele apresentou um discurso estranhamente triunfalista e afirmou que o "transgênico verde amarelo maravilha da biotecnologia nacional" representava um "golaço da moderna agronomia". Em primeiro lugar não se trata de trabalho da agronomia, não é verde e amarelo, e dificilmente poderá vir a ser um golaço. Vários feijões transgênicos já foram desenvolvidos, testados e descartados. Dada à escassez de informações que o cerca, com muita sorte, pode vir a ser um escanteio.


Em segundo lugar os elogios rasgados se apoiam em forte demonstração de desconhecimento dos procedimentos realizados nesta obra. O autor revela supor que, porque "demoraram toda uma década", os cientistas da Embrapa comprometidos com este projeto teriam trabalhado demais, ou mais rápido do que o resto do mundo (...) e, mais, supondo que a "biobalística, técnica de bombardeamento celular em laboratório" oferece alguma segurança e precisão científica e que o acaso não interferiu neste resultado onde "os cientistas conseguiram introduzir parte de material genético do vírus diretamente no genoma nuclear do feijoeiro"; o autor deixa claro que não entende do assunto. Talvez por isso não lhe ocorram dúvidas a respeito do que mais possa ter ocorrido com o genoma do feijoeiro e nem sequer questionou os experimentos que foram realizados em campo, aliás, foram realizados em 2008-2009.


Ao imaginar que há seriedade em frases como "o mosaico dourado trombou com a ciência", a "transgenia foi copiada da natureza", e que "a ciência superou o medo", o autor literalmente equivoca-se profundamente, não sabe quais são as regras do jogo e nem mesmo a diferença entre futebol de areia e em um gramado, mas isso se estivéssemos diante de jogo de futebol. Entretanto, a questão merece um tratamento adequado e não se trata de levantar uma bandeira de um time de futebol, de ser contra ou a favor.


Trata-se de pensar no futuro do País, no futuro de sua população, em sua saúde e bem-estar. Somos todos brasileiros, somos todos seres humanos e estamos no mesmo barco. O feijão é o segundo alimento da lista de consumo dos brasileiros, com um consumo diário médio de 182,9 gramas de acordo com pesquisa do IBGE (2011).


O que nós temos então nesse caso? Literalmente, a ciência se utilizou de mecanismos de uma bactéria, para incorporar transgenes que não se prestam a relações simbióticas - e nisso ainda estaríamos diante de mecanismos menos imprecisos do tiro no escuro da biobalística, método aleatório e sem precedentes na natureza-, e a ciência trombou, sim, não com o vírus transmitido pela mosca branca, mas com os interesses de curto prazo estabelecidos em instâncias decisórias, a ponto de permitir que a transgenia ameace definitivamente a natureza, e que esta pseudociência gere novos e fundados temores, apesar do ufanismo e miopia de muitos. Aliás, dos 22 eventos do feijão gerados para resistência ao mosaico, apenas dois destes funcionaram e não se sabe o porquê - isso relata a própria Embrapa!


Sim, há muita desinformação e por vezes mentiras no ar. Escutamos e lemos repetições de afirmativas sem fundamento, como as do autor a quem respondemos, ou ainda outras que alegam que uma panela de pressão pode dar conta de inativar todos os produtos no caso de feijão GM (Jornal Nacional 06.09.2011). E, a rigor, a população acaba por não saber o que mais mudou no feijão GM, não há informações sobre a contaminação e os riscos humanos e à saúde, enfim não sabemos sobre os perigos dessa tecnologia.


Mas, sabemos com certeza que graças à pressa desenfreada e a uma política do "jeitinho brasileiro" que não considera o fato que estamos lidando com alta tecnologia, "vem aí o feijão maravilha, obra prima da pesquisa nacional", e que se calem os cientistas que pensam o contrário, e torçamos todos para que o acaso ajude os que pensam ter tudo sob controle, pois só assim o pior será evitado. Ou no máximo estabeleceremos como para os veículos uma política de recall... a questão é... como fazer esse recall quando o que está em jogo é a saúde da população brasileira, o meio ambiente e relações que muitas vezes não são visíveis a olho nu.


Em que pese tudo isso, o autor estava certo quando afirmava que "resta[va] aguardar a liberação do plantio comercial do feijão transgênico, decisão a ser tomada nos próximos dias pela CTNBio" e isso foi o que ocorreu, sem que houvesse, todavia, no seio dessa comissão a possibilidade de manifestação de vários setores da sociedade civil, dentre eles, especialistas em defesa do consumidor e em saúde do trabalhador. Coincidência ou não, seria essa mais uma tática para afastar das discussões aqueles que questionam indagam e indicam a necessidade da realização de estudos para que efetivamente tenhamos um feijão maravilha seguro?


Foi assim então que na 145ª Reunião Plenária da CTNBio aos 15 de setembro de 2011 o feijão transgênico evento Embrapa 5.1 resistente ao vírus do mosaico dourado do feijoeiro foi aprovado: 15 votos a favor, 2 abstenções e 5 votos pela diligência, quer dizer, posicionando-se para que fossem realizados mais estudos. Merece destaque o voto do representante do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação que se absteve e fica a indagação: diante de questão tão complexa e importante para a sociedade brasileira poderia ele ter simplesmente ficado em cima do muro, enquanto em discurso nesse ano diante dessa comissão mostrou-se favorável não apenas a aplicação do principio da precaução e da biossegurança, mas do desenvolvimento do campo da geossegurança? Por que alguns membros indicaram a necessidade de mais estudos? Seriam eles radicais ou teriam como objetivo que houvesse um equilíbrio entre os interesses econômicos do desenvolvimento desse feijão GM e a saúde da população brasileira e proteção ambiental?


Há uma imensa dificuldade de controlar as partículas virais e a análise de risco nesse caso deve levar em conta essa particularidade. Trata-se de um feijão transgênico, a ser utilizado como alimento, que utiliza uma nova tecnologia que não foi nunca antes utilizada em larga escala em nenhum outro país, ou seja, nenhuma população foi em larga escala alimentada diretamente por um transgênico com essa tecnologia.


Entretanto, várias informações em relação a esse feijão transgênico foram consideradas confidenciais não permitindo saber exatamente o que foi inserido no feijão e, como relatam Nodari e Agapito-Tefen "Não se sabe quais proteínas transgênicas são expressas nesta planta. Não se sabe como detectar este transgênico em alimentos ou em outras plantas contaminadas" (Parecer técnico independente encaminhado a CTNBio por Nodari e Agapito-Tenfen - UFSC - a CTNBio sobre o processo 01200.00.005161/2010-86). A Embrapa, através de parte de seus pesquisadores, ao impedir o acesso da comunidade científica ou da população às informações moleculares está contribuindo para o obscurantismo da ciência, ao não querer mostrar o que de fato está ocorrendo no feijão transgênico. Esconder da sociedade o que estará dentro de um prato de comida não foi uma prerrogativa dada pela sociedade a uma empresa mantida com recursos oriundos desta própria sociedade.


E parte do que se sabe foi relatado na reunião por um dos membros da CTNBio: em parte do processo a Embrapa indica que os estudos com sete cobaias foram realizados por 35 dias, em outra parte o período indicado foi de 45 dias e, dessas sete cobaias, quatro são fêmeas e três machos. Apenas os três machos foram sacrificados e estudos realizados em seus órgãos, tendo sido constatados problemas. Assim, a Embrapa não se diferencia de outras empresas que também submeteram pedidos de liberação de OGMs, cujos estudos são de baixa qualidade científica. Há ainda vários aspectos a serem considerados que exigem estudos adicionais. Mas mais uma vez, a maioria dos membros da CTNBio desobedeceram o artigo da Lei de Biossegurança, que exige a observância do principio da precaução.


É possível afirmar que essa decisão não observou as próprias normas da CTNBio: não foram apresentados todos os estudos exigidos pelas normas da comissão, os poucos estudos não analisam as condições observadas nos biomas nacionais, pouco se sabe sobre o que ocorrerá quando o transgene migrar para as variedades crioulas de feijão, e enfim, o parecer final não considerou estudo apresentado por geneticistas da UFSC nem o parecer contrário apresentado em Plenária. Alias o parecer consolidado já estava preparado e os 15 votos favoráveis já eram conhecidos e estavam assegurados como demonstra inclusive uma lista de adesão veiculada na internet pelo presidente daquela Comissão: o momento é de festa, em que pese a penumbra. O momento é de festa em que pese não estejamos efetivamente em face do feijão maravilha seguro! E segure-se quem puder, já que o poder público não nos assegura segurança!


Rubens Onofre Nodari, professor titular da UFSC
Solange Teles da Silva, professora da UEA
Paulo Yoshio Kageyama, professor titular da ESALQ/USP
Luiza Chomenko, pesquisadora MCN/FZB-RS
Magda Zanoni, professora da Universidade Paris-Diderot

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Bolinho de cará-moela ou cará-do-ar

Sou apaixonada por cará-moela. Não especialmente pelo sabor quase a alcachofra ou pela textura de batatas,  mas pela rusticidade e durabilidade. Já tem mais de um mês que um tanto deles foram colhidos do quintal e ficaram numa cesta. Alguns, dei de semente, outros comi na sopa. Guardei alguns para replantar e eles já começam a lançar brotos.  Se quiser saber mais sobre esta espécie, é só procurar aí do lado, na caixa de buscas. Já falei bastante no Come-se sobre eles.

Diferente das batatas que apodrecem logo, que lançam brotos e verdejam as cascas tornando-as impróprias para o consumo por causa da solanina,  os carás moelas dificilmente apodrecem ou germinam antes da hora (na primavera, aí sim!). Ficam imutáveis como pedras durante meses. E são rústicos também no cultivo. É só jogar um na terra e ele se arranja, logo lançando descendentes.

Bolinho de cará-moela: como tinha alguns carás sobrando, resolvi fazer bolinhos inspirados naquelas coxinhas de batata de Limeira, aproveitando que sobrou também um pouco de pernil assado de ontem. Foi só cozinhar os carás - do branco e do roxo,  em água com um pouco de sal até que ficassem molinhos. Escorri, espremi ainda bem quente e pesei (deu 130 g). Juntei então 1 colher (sopa) de farinha de mandioca bem fininha e gomada, baiana. O fato de o cará estar bem quente é fundamental para que cozinhe um pouco a farinha e ajude a dar liga - por isto cozinhei sem as peles. Temperei com sal e amassei bem. Se a sua massa ficar um pouco seca, é só juntar um pouco de leite. A minha não precisou. Dividi em bolas de 35 gramas e recheei com o pernil assado bem picado e temperado com mais salsinha picada.  Abri cada bolinha com os dedos, como se faz para rechear coxinha ou quibe, coloquei o recheio, selei bem e ajeitei com as mãos para que os bolinhos mantivessem o formato esférico.  Fritei em bastante óleo bem quente e ...

Nhac!

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Pão de abóbora com nozes


Ontem foi dia de piquenique e achei por bem usar a moranga cabochá que tinha aqui. Se recheio de abóbora com nozes fica bom em massas, um pão com as duas coisas não deveria ficar ruim. Foi o que fiz pra levar e como acho que ficou bom - pelo menos não considero meus amigos mentirosos, deixo aqui a receita antes que ela fuja para o arquivo morto.  Do piquenique, falo depois. 

Os pães crus

Pão de moranga cabochá e nozes 

1 envelope de fermento biológico seco (10 g)
1 1/2 xícara de água morna 
1 colher (sopa) de sal 
3 colheres (sopa) de açúcar 
500 g de abóbora japonesa (moranga, cabochá) cozida, fria, sem a casca - cerca de 2 1/2 xícara da polpa amassada 
1 ovo 
Farinha de trigo - cerca de 1 quilo 
100 g de manteiga em ponto de pomada
200 g de nozes picadas

Numa tigela, misture o fermento com um pouco da água. Deixe dissolver até formar um creme. Junte o restante da água, o açúcar e o sal e misture bem. Adicione a abóbora em purê e o ovo e misture bem. Se quiser, passe esta mistura pelo liquidificador para ficar bem lisa. Vá juntando farinha de trigo aos poucos. Quando ficar difícil de mexer, junte a manteiga e as nozes - reserve metade da quantidade para polvilhar sobre o pão. Passe a massa para uma superfície de trabalho enfarinhada e comece a trabalhar com as mãos, juntando farinha à medida que amassa, até formar uma massa homogênea, lisa, modelável, que se solte das mãos. A massa deve ser colocada novamente na tigela, coberta com plástico ou um pano. Espere crescer até dobrar de volume (caso não tenha experiência com pães, faça uma bolinha com a massa e deixe num copo com água em temperatura ambiente – quando ela subir à superfície, a massa certamente estará no ponto). Divida a massa em três ou quatro e molde os pães compridos ou redondos.  Umedeça os pães com água e role-os sobre as nozes picadas reservadas.  Coloque-os numa assadeira grande, untada e polvilhada, deixando espaço entre eles. Deixe crescer novamente por cerca de meia hora ou até os pães dobrarem de volume. Faça cortes com lâmina afiada, leve ao forno preaquecido bem quente (280 ºC) e deixe assar por 10 minutos. Abaixe o fogo para 230 ºC e deixe assar por cerca de 50 minutos. Os pães devem ficar bem dourados. Se preferir, polvilhe os pães com farinha e use apenas 100 g de nozes na massa. 
Rende: 3 a 4 pães 



No piquenique, com carne louca da Chus. Nhac! 

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Come-se em Ribeirão. Zio Totó!

Não posso nem dizer que conheço Jaboticabal, onde estive antes de ontem para dar uma palestra no Senac. É que desta vez tive que optar entre conhecer uma nova cidade ou rever velhos amigos. A decisão foi óbvia. Rosa e João moram em Ribeirão Preto, que fica do lado, e eu estava morrendo de saudade. Podemos ficar anos sem nos ver, o que não é bom quando se trata de amigos tão queridos,  mas é como se estivéssemos sempre por perto. Somos amigos desde a faculdade, quando morávamos no Crusp (o conjunto residencial da USP) nos anos 80.  Os dois casais já tinham filhos. Marcos e eu, Ananda;  Flora e João, a Flora (depois vieram Estela e Gabriel). Já naquela época, os dois largaram tudo por aqui e foram viver em Ribeirão Preto, onde Rosa tinha família que tocava uma trattoria (a Zio Totó), aberta pelo pai siciliano autêntico, Dom Calógero Provinzano. 


Os dois abriram a própria pizzaria Zio Totó e trabalharam muito para torná-la o sucesso que é hoje. A trattoria continuou nas mãos da família, comandada hoje pela Rosana, outra filha do Dom Calógero. O filho, Rômulo, também abriu sua pizzaria por perto. De modo que Zio Totó (o nome é uma homenagem carinhosa ao tio italiano) está presente em três endereços em Ribeirão, como exemplo de dedicação familiar.


Eu posso ficar anos sem ir pra lá, mas sei sempre o que vou encontrar e tenho saudade daquelas pizzas de massa fina e crocante, bem ao modo do povo do norte italiano, contradizendo propositalmente a origem siciliana de Dom Calógero, que já morreu (a pizza de massa grossa é mais comum no Sul).  João faz pessoalmente as compras de ingredientes frescos todas as madrugadas. Assim, pizzas de brócolis, abobrinhas e escarolas não escondem o frescor quando combinadas com queijos de ótima qualidade que eles fazem questão de usar (nada daquelas mussarelas feitas de batata). 


Os dois amigos foram comigo para Jaboticabal e na volta, já tarde da noite, passamos na pizzaria - o momento mais aguardado.  Para os de casa, além da pizza, um pouco de comida de brigada.  Naquela noite, por sorte, teve  jiló refogado com bastante salsinha. Divino. E salada farta. Nada que desviasse o desejo da pizza que chegou dourada, perfumada e muito quente sob a tampa que brilha prata. As minhas preferidas: de brócolis, de abobrinha grelhada (receita da Rosa, impecável) e de alho poró. Se ficasse mais uma noite, também teria a de escarola. Como diz o Marcos, eu gosto de pizza de mato.  João abriu um vinho e terminamos a noite assim. 


Quando estiver em Ribeirão, dê uma passada na pizzaria da Rosa e do João, que fica na Rua Marechal Deodoro, 16. A pizza é muito boa, o lugar é lindo, com jardim iluminado e mesas ao ar livre, com preços bem camaradas quando comparados com São Paulo e ótima acessibilidade para cadeirantes.  Os dois estão toda a noite por ali, quase sempre no caixa ou no salão. E se faltar garçom, João não se faz de rogado - veste o avental e vai te servir.  


Veja também os endereços dos irmãos Rosana e Rômulo: www.ziototo.com.br 

Jiló, só para os da casa. Sorry!


A de brócolis. Nhac!

Fiquei impressionada com o brilho do alumínio areado, como prata.

Desta vez,  Jaboticabas só estas da casa dos amigos. Mas, Jaboticabal, um
dia eu volto com tempo pra te conhecer melhor! 





E R 

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Cuscuz de milho com carne moída. Baixaria, mixaria ou quinta sem trigo 34

Esta é minha versão atual : Mixaria (cuscuz de fubá, bem soltinho, com
carne moída refogada, servido com vinagrete)

Desculpe pelo adiantado da hora, mas acabo de voltar justamente de uma viagem para Jaboticabal, onde estive para dar uma palestra sobre "Cozinha local e sem gluten", no Senac (Veja a programação das outras unidades aqui). Falei das possibilidades de pratos sem glúten, para quem tem doença celíaca, usando pratos regionais e ingredientes comuns, que costumávamos usar como fonte de carboidratos antes do uso difundido do trigo. E me lembrei do cuscuz com carne moída que comi Rio Branco - AC, que responde pelo nome nada elegante de "baixaria". 


Entre as delícias do café da manhã acreano que inclui tapioca e vários tipos de mingaus, o prato de cuscuz é o mais emblemático no Mercado do Bosque, em Rio Branco.  Eu comi no Mercado Novo (que já está velho enquanto o Mercado Velho é novo, pois foi totalmente reformado) e,  tão substancioso que é, serviu de almoço.  Hoje pode ser encontrado em todos os mercados. 

O que era antes um prato para trabalhadores e aqueles que faziam a feira logo pela manhã, no lugar do pão, passou a ser comida de resistência especialmente de madrugada para os notívagos e desgastados pela folia, antes de irem para casa dormir o sono do justos e baladeiros. Ou, seja, pode ser a primeira ou última refeição do dia, um prato completo para toda hora.  

Desde que voltei de Acrelândia, quando estou sem tempo de cozinhar, em vez de fazer um macarrão ao sugo, que também é rápido e gostoso e é como se fosse meu miojo, dispenso o trigo e mando uma baixaria no almoço ou jantar.  Basta fazer um cuscuz de milho e servir com carne moída refogada, ovo frito e cebolinha. Por aqui já virou outra história, que eu passei a chamar de "mixaria", pois, como não sou pessoa exaurida pela folia, acho demais duas proteínas no mesmo prato e substituo o ovo por um vinagrete mais caprichado com cebola, cheiro verde e tomate. Às vezes couve refogada. 

Comecei fazendo o cuscuz com flocos de milho como fazem por lá. Mas agora prefiro o cuscuz de fubá que fica como o marroquino, bem soltinho. Veja como fazer aqui. E comecei a mudar também o jeito de servir. Para que não digam que mexi demais na tal da baixaria, que eu respeito, adoro e quero que continue como sempre foi, para eu comer de novo quando for a Rio Branco, insisto que esta "mixaria" é por minha conta. Se quiser, invente a sua, mas vá por este caminho - cuscuz e carne moída molhadinha, que dá muito certo. 



Este é imitação do original, que fiz em Acrelândia, logo depois de ter
provado o prato em Rio Branco



Este é o que comi no Mercado Novo (o velho)



Um dos inúmeros que já fiz por aqui - com flocos de milho, já sem ovo

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Brotos na garrafa de coca-cola

Para um trabalho de pesquisa comprei uma garrafa de coca cola light plus (super, mega, hiper... que mais?) e, antes de aproveitar seu conteúdo para limpar o ralo da pia, enchi um copo para mim e outro para minha amiga Silvinha que, como eu, não costuma tomar refrigerantes. Eu até que acho coca-cola normal gostosa, mas não tomo. Achamos este light plus muito doce e enjoativa, me atrapalhou o jantar e fiquei sentindo um retrogosto persistente.

Se tem uma coisa que faço muito bem é dormir. Não consigo ler uma página de livro, pego rápido no sono e não acordo por nada deste mundo antes do meu horário natural, que é por volta das 7 horas (às seis me levanto porque o Marcos me chama e eu gosto de tomar café com ele). Mas naquela noite fiquei rolando na cama, com o coração palpitante. Depois de um tempão rolando na cama, consegui dormir um pouco e acordei depois de meia hora. Dormi mais uma meia hora e acordei de novo. O sono não vinha. E assim foi a noite inteira, mais acordada que dormindo.

Pela manhã, perguntei à minha amiga Silvinha se tinha dormido bem e fiquei sabendo que não, que tinha sido como eu. Como nunca tomamos coca-cola, a relação foi imediata. A propaganda do produto, que vi no cinema antes do filme,  mostra uma mulher ativa, que trabalha o dia inteiro e ainda consegue dar show na balada à noite. Imagino que tenha mais cafeína que as outras, não sei.  Poderia testar com outros tipos em nome da ciência, mas quem merece uma insônia daquelas? Tô fora. Para hidratar, melhor água e frutas, que eu adoro.

O engraçado é que agora nem mais podemos dizer que se trata de "caloria vazia", afinal esta coca-cola não só é vazia de caloria como ainda traz um menu de vitaminas (é como você tomar refrigerante e uns comprimidos de complemento nutricional). E, como é o caso do sucrilhos e de tantos outros alimentos vitaminados, das duas, uma:  ou você se entope de vitaminas arcando com os prejuízos da superexposição ou você está pagando por um complemento que vai todo para o ralo. Eu tenho mais medo do primeiro caso, mas o segundo é também um crime contra a economia popular pois está pagando por algo que não aproveita.  E ainda tem a questão de ser muito doce. Tanto faz com açúcar ou adoçante, o excesso de doçura faz com que nosso paladar seja forjado a achar que um suco de laranja mereça uma colherada de açúcar (pode reparar nas lanchonetes). E o fato de ser adoçante, tanto pior, afinal ninguém pensa quando está tomando um refrigerante em somar tudo o que consome com adoçante ao longo do dia para saber se está ainda dentro da faixa segura de consumo. E ao longo dos anos? Lembremos que ainda não houve tempo para estudos de longo prazo. Pode ser tarde demais quando se conseguir provar os malefícios mesmo nas quantidades ditas seguras de  adoçantes e outros antes, especialmente para as crianças e adolescentes que começam a ter acesso a tudo isto tão precocemente. Antes, prefiro evitar.

Aproveitei a garrafa para produzir brotos. Foi só furar para escorrer a água. O resto é igual ao que mostro aqui.  

Um pouco dos brotos usei para refogar em alho e juntar a uns pedacinhos de carne de porco que sobrou do almoço. Juntei ainda a sobra de arroz e fiz um prato único.