segunda-feira, 31 de março de 2008

Happy Hour do Slow Food

Muita gente legal apareceu ontem, domingo, num happy hour do Slow Food São Paulo, no restaurante Bananeira, que acabou sendo um encontro intermunicipal, interestadual, já que estavam lá também o Paulo Chanel, líder do Convívium Piracicaba e a chef Teresa Corção, do Restaurante O Navegador, e do Convívium Rio de Janeiro. Entre amigos, gente conhecida, caras novas, foi gostoso.




Cris, Alessander e Giuliana
O Alessander registrou suas impressões no Blog Cuecas na Cozinha.
Pat Feldman, que não aparece aqui mas marcou presença, também conta um pouco no seu site Crianças na Cozinha.


Márcia, Lilian e Kátia


Teresa e Cenia


Paulo Chanel e Ivana.
Ivana também comentou o evento no blog Doidivana.



Tenho o maior orgulho de ser prima dela.

Feirinha Boliviana

Fomos no domingo de dia à feirinha dos bolivianos: Cenia Salles, líder do Slow Food; Teresa Corção, chef do Restaurante O navegador e do Slow Food do Rio, e eu. Sempre tinha comido salteñas, mas desta vez Cenia e a Teresa quiseram experimentar um prato de verdade. Pedimos um só para provar. Lomo assada: carne de porco, banana e batata-doce assadas. Muito bom, substancioso, bem temperado. Mas da próxima vez vou levar meu prato e talheres, pois são servidos com faquinha e garfinho de plástico fininho, daqueles de comer bolo, que não suportam cortar um pedaço de carne. Bem, voltamos cada qual com sua sacolinha - milhos coloridos, favas, quinoas, chás de coca, pimentas/ rocotos, quirquinha – uma erva de aroma maravilhoso, batatas divertidas y otras cositas más.


Teresa e eu. Difícil escolher.

Feira Boliviana: todos os domingos, das 11h às 19h, na praça Kantuta - altura do no 625 da rua Pedro Vicente, bairro do Pari, São Paulo (SP). Melhor chegar depois das 13 horas, quando está mais agitada e divertida. Como chegar: Fica a 700 metros da estação Armênia do metrô, saída para a rua Pedro Vicente. É só perguntar, todo mundo sabe.

Virgulino e Maria


Não, a brincadeira não estava no saguão do teatro. Lá tem coisa mais chocante. Esta aqui foi em João Pessoa, Marcos e eu há dois anos. Ele, com cara de mau.
Depois do churrasco do Pedro, já meio livre da tosse, fomos ao teatro ver “Virgulino e Maria – Auto de Angicos", uma recriação dos últimos momentos supostamente vividos por Maria Bonita e Lampião, o casal mais famoso do Sertão. Texto do Marcos Barbosa e direção do Amir Haddad, com Marcos Palmeira e Adriana Esteves. Na derradeira madrugada os dois partem antes de acenderem a lenha para passar o café. Mas a história não gira em torno disto, é claro. É que este é um blog de comida e bebida, afinal. Aliás, tem mais. De todo mundo que esteve no teatro Tuca-Arena no sábado talvez só eu tenha recebido um tratamento tão VIP. Numa das duas crises de tosse que tive, saí pela porta onde se lia “saída”. Só que me deparei com um camarim, às moscas. Continuei lá tossindo e observando o espelho, as roupas, a comida beliscada às pressas, o adoçante aberto. E tossindo. Não havia ninguém. Quer dizer, havia, ouvi passos. Mas não apareceu para não me constranger, suponho. Quando terminei, saí, mas continuei meio por ali com medo de a tosse voltar. Não voltou, mas apareceu o homem grandão, fortão, com cara de mal, que ajudava no cenário. Pedi desculpas por ter entrado lá, disse que não o faria novamente, que não sabia e blá blá blá cochichado. Ele fez cara séria, disse que não podia mesmo, fez sinal com a mão para eu esperar e entrou no camarim. Pronto, vai trazer a polícia, lavrar o auto de flagrante. Dali a pouco vem o homem com um copinho com água, açúcar e delicadeza. Acho que desde a infância não tomava água com açúcar. Como estava sem mexer, no começo era uma aguinha adocicada. Mas à medida que foi chegando no final, a coisa foi melando de um jeito que foi difícil engolir. Só que estava muito emocionada e melancólica para rejeitar. E não é que a tosse passou?

A despeito de qualquer atrocidade que este casal de cangaceiro e seus cabras tenham cometido, a história de amor entre Lampião e Maria Bonita era linda. E os atores estão ótimos. Vale a pena. Mas se você está com tosse e acha que ela vai se segurar no teatro, não se engane. Aí que ela vem com tudo. Basta saber que não pode. Para saber mais sobre a peça e ainda assistir a uma canjinha pelo You Tube, veja aqui:

A peça está no Tucarena - PUC-SP

Rua Monte Alegre, 1024 – Perdizes, São Paulo
Tel. 3670-8455

Farofa de fim de semana

Sábado foi aniversário do meu amigo Pedro Henrique, em Itu. Céu azul, sol de outono, piscina, churrasco, caipirinhas de frutas, cerveja e eu sem poder tomar gelado. Tosse que tosse. Fiquei no pão com lingüiça e saladinha de cebola terapêutica. Especialidade dele, segundo o próprio. Combinei as duas coisas no recheio do pão francês fresquinho. Pra que mais? Simples e deliciosa. E o barman me fez uma caipirinha de limão com kiwi quentinha, anestésica, quase anti-tussígena. E mais: bolo, chocolate, bala de coco. Em festa tudo é folia. E teve farofa famosa do Pedro, mas desta fiquei a meia distância (provei, crocante, adocicada, muito boa), mas farofa e tosse nunca foi uma boa combinação.

Salada de cebola roxa do Pedro Henrique
Corte várias cebolas roxas em rodelas e deixe de molho em água gelada. Troque a água várias vezes. Escorra bem e tempere sal a gosto (pode ser flor de sal ou sal grosso moído), muito azeite de oliva e aceto balsâmico a gosto. No final, hortelã picadinha quanto quiser. Sirva com churrasco.

Pedro, eu faria uma variação assando as cebolas um dia antes e só no dia cortaria em rodelas e juntaria os temperos. Deve ficar mais adocicada e colorida. Só como variação. Porque com churrasco e linguiça, esta estava perfeita.


Farofa festiva

Refogue em bastante manteiga cebola bem picadinha. Junte farinha de milho, sal (flor de sal ou sal grosso triturado) e um pouco de azeite, mexendo no fogo, sem parar. Acrescente cheiro verde picado,
um pouco de azeitona cortada sem caroço, banana prata fatiada, maçã verde picada grande, ameixa seca bombom cortada em dois ou três e damasco seco em quartos. Mexa bem até estar tudo aquecido e pronto. Farofinha de festa.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Si, nosotros tenemos huitlacoche

Desta safra, em Fartura-SP
Foi através desta crônica da Nina Horta, escrita há anos, que conheci huitlacoche (aliás, quanta coisa aprendi com ela!). Corri atrás de informações e fiquei sabendo que o mesmo é tratado aqui como praga do milharal. Então estava fácil...




"Huitlacoche" vale uma deliciosa cantada

NINA HORTA
Colunista da Folha

Minha sócia e eu fomos comer um cozido num restaurante antigo da cidade para lembrar o gosto e ver a quantas andava a mostarda de Cremona.
Era um almoço de dia de semana, chocho, poucas mesas ocupadas, homens de negócio conversando dólares sobre o prato de massa e um ou outro vago turista caído ali por acaso, hospedado no hotel.
Na mesa ao lado da nossa sentava-se um casal moço, ele de terno, bonitão, ela de roupeta de trabalho e óculos.
Enquanto beliscávamos o patê do couvert ouvíamos só a voz do homem, intensa mas monocórdica, e algumas tímidas intervenções da mulher. Ele falava inglês com um leve sotaque a la Arnold Schwarzenegger. Ela ouvia. Nós pesquisávamos o cozido.
Naquele dia o cozido, ótimo em outros tempos, estava ruim. Era um prato triste, de hospital, pálido e frouxo, um arremedo do que fora. Desoladas, conversávamos abobrinhas.
De repente, ouvi distintamente uma palavra que se definiu, clara, iluminada, saída daquela zoeira do Schwarzenegger, a palavra "huitlacoche". Todos os meus ouvidos da nuca se alertaram. "Huitlacoche"! Só eu sabia o que era aquilo! Impossível que um executivo em viagem introduzisse na conversa esta palavra mirabolante, tão específica, tão ligada à comida. Parei de mastigar, parei de criticar o cozido, torci o pescoço com naturalidade e fiz um olhar distraído, dirigido ao infinito de quem não está ouvindo conversa de ninguém.
"Cuitlacoche" ou "huitlacoche" é um fungo prateado por fora, preto por dentro, que dá nas espigas de milho verde e é muito apreciado no México.
É uma praga, uma excrescência da espiga que se deforma, cresce e faz com que o milho se abra numa explosão precoce. O nome botânico é Ustilago maydis e o nome dado pelos astecas, é "cuitlatl" (excremento) e "cochtli" (adormecido).
Nos Estados Unidos e na Inglaterra, (na França não sei), é uma das novas comidas descobertas pelo mundo gastronômico. Um cocô dormido, dirão os céticos, como os astecas. Não, mais uma jóia de exotismo, um cogumelo raro, uma coisa que não se planta, que brota sem que se espere, uma trufa nas barbas loiras do milho, este camponês.
Ao cozinhar, solta uma tinta preta, muito, muito saborosa. E ali, bem ao nosso lado, um homem com cara de economista sabia o que era "huitlacoche". E falava.
-Fiz um "chowder". Você sabe o que é um "chowder"? Digamos que é uma sopa, para simplificar. Uma especialidade do Maine. Fiz um "chowder" de milho. Comecei pondo uns pedaços de banha de barriga de porco no caldeirão. Poucos, para não engordurar demais o caldo. Esperei que encolhessem, juntei uma cebola e duas batatas picadinhas.
-Huum...
-Calma aí. Mais um litro de leite, grãos de 12 espigas raladas, mais os sabugos, os sabugos para dar gosto, tirei depois. Não se pode deixar ferver. É só aquele fogo baixinho.
Schwarzenegger pontificava. E nós, cozinheiras, aos poucos durante a arenga que foi longa, detalhada, fomos nos apaixonando furiosamente pelo homem que tentava seduzir a mulher com uma receita de sopa.
Era dos nossos! E que ciúme daquela menina desenxabida que só dizia hum, hum, fascinada pelos dentes e amígdalas do falante, uma bobinha ignorante que não sabia o que era "huitlacoche".
-O tempero é só sal e pimenta-do-reino. Tem gosto de horta, fresco, doce, forte, e aí não aguentei, pirateei, sorrateiramente contrabandeei e juntei ("I smuggled in") um lote de "huitlacoche" ao caldo. Prato fundo, um quadradinho de manteiga por cima, pão preto, você nem imagina.
Schwarzenegger salivava e quase engoliu a menina ali, na hora, com sal, pimenta e "huitlacoche".
Foi a primeira cantada culinária que ouvi. Pela cara de sapo hipnotizado pela cobra grande da menina, acho que funcionou
. Nina Horta


Da safra passada
No México eles o cultivam propositalmente desde a época dos Aztecas, mantendo o pé fungado na plantação, inoculando os esporos. Aqui levam-no para bem longe, para nunca mais voltar. Está certo, pois lá é uma iguaria, todos apreciam. O milho com fungo tem mais valor que o milho saudável. Aqui, não. Seria um sabor a ser adquirido. Bem, se era praga de milharal, meu pai certamente conhecia. Dei o nome do fungo e nada. Falei do aspecto e ele matou. Carvão! Ficou chocado em saber que se comia aquilo que pareciam grãos com tumor. Aliás, ele experimentou e disse eca. Mas, também tem que saber preparar e ele só meteu na boca, ainda cru. Como ele planta milho índio, imagino que seja uma planta mais suscetível a este tipo de praga que os milhos melhorados e resistentes, mais comuns por aqui. Mas, mesmo assim, acontece pouco. Desde que fiquei sabendo, sempre que são encontrados, são guardados no freezer para mim que, por chacota, virei neide-carvoeira. Pela experiência, minha mãe acha que isto acontece quando a planta recebeu muita umidade na época da formação da espiga ou quando a terra é pobre e as espigas saem ralas ou ainda quando os grãos são plantados fora do tempo. Por exemplo, se plantar agora. Já meu pai acha que não, acredita que só depende da lua. Se plantado na crescente a espiga vai ficar mais aguada e sensível ao fungo. Eu só sei que se quisesse realmente cultivar huitlacoche iria pesquisar a verdade a fundo. Para começar, é só fazer o inverso de todas as recomendações para evitá-lo. Mas, apesar da delícia que é, o engraçado e emocionante é assim, a sensação de comer uma raridade: uma ou duas trufinhas mexicanas ao ano. Tá bom assim, se não, perde a graça. Mistura de milho defumado com fungo de madeira molhada. No México, eles são vendidos frescos ou enlatados.

Minha sopa é uma adaptação de outra que tirei daqui.



Sopa de batatas com huitlacoche

2 colheres (sopa) de azeite de oliva
1 cebola roxa picada
40 g de huitlacoche picado
6 batatas médias descascadas e fatiadas
1 litro de caldo de frango caseiro quente
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes corta pela metade, de comprido
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes picada em rodelas
2 colheres (sopa) de salsa com epazote (erva-de-santa-maria, mastruz/ mentruz-de-arbusto) picado
Sal a gosto
Aqueça o azeite de oliva numa panela grande, fogo alto, junte a cebola e refogue até amolecer. Acrescente o huitlacoche e as batatas e mexa por mais um minuto. Coloque o caldo de frango, a pimenta dedo-de-moça e salgue a gosto. Com a panela tampada e fogo baixo, cozinhe por cerca de 30 minutos ou até a batata estar bem macia. Se preferir mais suave, tire a pimenta. Se não, passe tudo pelo mixer ou liquidificador (neste caso, espere antes amornar um pouco). Volte ao fogo, deixe ferver. Se estiver muito densa, junte mais água fervente para deixar a sopa com consistência cremosa e fluida. Junte as rodelinhas de pimenta e as ervas e sirva. Se quiser, espalhe sobre a sopa queijo fresco ralado.
Rende: 4 porções

Sãos estas coisinhas pretas o huitlacoche. Usei caldo de frango caseiro bem gorduroso para curar minha gripe, mas poderia ter desengordurado.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Milho inguirim refogado



No Paraná, onde meus pais foram criados, inguirim é o nome dado, pelo homem do campo pra não dizer caipira, ao milho não granado, não maduro. Os dentinhos são claros, saborosos, perfumados, sabendo a palha nova. Ninguém ousaria colher um milho assim para mandar ao comércio. É claro, maduros valem mais. Por isto a gente nunca vai experimentar na cidade um milho refogado tão leve, adocicado, macio e gostoso quanto aquele que se come no sítio, feito no fogão de lenha, com um toque de gordura de porco. E, mesmo no sítio, eles costumam aparecer apenas como sobra do milho colhido para pamonha. Alguém o colheu errado, com o cabelo da espiga ainda grudado. Para reconhecer um e outro, observe: o cabelo (estilo-estigma) de ambos deve estar seco. No milho para pamonha, o cabelo, ao ser puxado, deve sair sem resistência. Neste ponto, os grãos estarão graúdos, gordos, firmes e leitosos, mas não duros. Veja como são, na postagem de ontem. No milho inguirim, o cabelo puxado não vem. Mas as espigas vêm clarinhas, minguadinhas, danadinhas de boas.

Milho inguirim refogado
1 dúzia de milho inguirim
2 dentes de alho amassado
1 cebola pequena picada
2 colheres (sopa) de banha de porco ou óleo vegetal
1,5 colher (chá) de sal ou a gosto
1 colher (chá) de pimenta-do-reino
½ xícara de cheiro-verde (salsa e cebolinha) picado

Com uma faca, corte os grãos do milho, rentes ao sabugo. Reserve-os.
Numa panela grande, de ferro ou de fundo grosso, em fogo alto, refogue o alho e a cebola na gordura até murcharem, sem deixar dourar. Junte os grãos de milho e o sal (ele não vai endurecer a fibra macia como acontece com o milho maduro) e vá mexendo devagar para que o milho cozinhe em sua própria umidade (cerca de 7 minutos). Se for preciso – neste da foto, não foi necessário -, junte umas gotinhas de água fervente. Quando estiver macio, desligue o fogo e tempere com a pimenta-do-reino e o cheiro-verde.
Rende: 8 porções

quarta-feira, 26 de março de 2008

Pamonha da Dona Olga para o Seu Toninho


Come-se com cafezinho.

Já vi por aí muita gente reivindicando para si a verdadeira receita de pamonha. Aqui no Brasil, talvez só os índios possam fazê-lo. A pamonha dos Guarani é feita com folhas de caetés e o milho ralado não leva sal ou açúcar. E achei uma delícia. Todas as outras que conhecemos são derivações, acomodações ao gosto particular ou recursos da região. Podem levar gordura de porco, lingüiça, queijo, água, leite, leite de coco, coco ralado e outras estrepulias. E ainda cada família tem seus segredos no jeito de triturar o milho, temperar, embalar, amarrar, cozinhar. Para não falar besteira a respeito de sua origem, fui consultar a antropóloga Paula Pinto e Silva, autora do livro Farinha, Feijão e Carne-seca – Um Tripé Culinário no Brasil Colonial.


Aqui, a resposta dela, por email:
Não saberia dizer ao certo quem é o "dono" da pamonha... Eu diria que é um prato que faz parte dos povos que cultivam o milho tradicionalmente nas Américas, embora estejamos também falando de espécies diferentes. Isso significa dizer que seus rituais estão associados ao plantio e colheita de milho, bem como seus mitos de origem vinculados ao cereal. Talvez isso explique a similitude entre Guarani, mexicanos, chilenos e costa riquenhos (entre outros) - a disseminação da receita vem do contato entre esses povos indígenas. Paula Pinto e Silva.

O fato é que fazer pamonha sempre foi uma atividade gregária e na casa dos meus pais e avós era tradição reunir a família toda na época do milho verde, que vai até o fim do verão. Infelizmente a tradição está acabando, meus avós morreram, minhas tias dificilmente se reúnem e agora só resta o pequeno núcleo cujos filhos já não querem ter tanto trabalho para experimentar uma iguaria cujo resultado, todo mundo diz, não justifica a trabalheira. Dos netos, então, nem se fala. Agora já acredito que no caso da pamonha deve-se levar em conta não só a satisfação de comê-la na hora do descanso depois de quase um dia de trabalho, mas também o prazer do trajeto.


Minha mãe sempre fez pamonha a olho. Mas desta vez, fiquei atrás dela com medidas padronizadas e balança. Para o meu pai, nenhuma pamonha além desta presta. Segundo ele, o importante é o equilíbrio entre sal e açúcar, sendo ela doce ou salgada. Para comparar, comprei na cidade (Fartura-SP) uma pamonha doce quentinha, recém-feita com capricho, milho passado no ralador, amarrada na palha, toda bonitinha. Perguntei a receita e levei para provarmos. Não disse nada, simplesmente a coloquei ao lado da nossa. Seu Toninho mal colocou na boca e já foi dando o veredito: faltou o sal (de fato, a vendedora disse que só colocou água e açúcar). Mas a pamonha não tinha nada de ruim. Era bem gostosa até, só não do jeito que ELE gosta. Portanto, se não for feita apenas com o puro creme do milho como a dos Guarani, qualquer outro tempero vai do gosto de cada um. O importante é o milho, o processo.

Bem, esta é uma receita da Dona Olga para o seu Toninho, que tem lá suas idiossincrasias, mas realmente fica muito boa. Quem quiser arriscar, lá vai, mas saiba que, a partir daí, poderá inventar à vontade, de acordo com seu gosto. Para fazê-la salgada, aumente a quantidade de sal e use a mesma quantidade de açúcar (2 colheres de sopa de sal, 2 de açúcar, por exemplo).

Pamonha doce

24 espigas de milho verde, grandes, bem granadas, com palha
1 litro de leite
1 xícara de óleo de milho ou de canola (240 ml)
2 colheres (sopa) de manteiga amolecida (24 g)
2 colheres (chá) rasas, de sal (10 g)
4 xícara de açúcar cristal (720 g)

1. Faça um corte em toda a volta da base de cada espiga e separe as palhas grandes, flexíveis e perfeitas para fazer o invólucro.
2. Num ralo grande, rale cada espiga até chegar ao sabugo, que deve ficar bem limpo.
3. Coloque 1 litro de leite morno numa tigela e vá molhando nele cada sabugo e raspando bem forte com uma colher para tirar todos os germes ou coração do milho. A espiga deve ficar bem sequinha. Despeje todo o leite na massa de milho e tempere com o óleo, a manteiga amolecida, o sal e o açúcar. Misture bem. Para conferir o tempero, pegue umas duas colheres da massa, coloque numa panelinha e leve ao fogo para engrossar. Só então prove e veja se precisa adicionar mais sal ou açúcar a seu gosto. Deve render cerca de 4 quilos de massa.
5. Lave as palhas em água corrente e faça amarrilhos com palha seca passada em água fervente.
6. Pegue palhas de boa largura (algo como 14 centímetros a parte mais larga), apóie três dedos na parte de dentro e enrole, fazendo uma bolsinha, usando os três dedos para prender a parte que transpassa. Com a outra mão, dobre o bico, parte de baixo, para cima para fazer uma canequinha, onde será colocada a massa de milho até a borda. Com a outra mão, faça outra bolsinha igual, por cima daquela que está cheia, deixando a abertura e a dobra do outro lado. Apóie a pamonha num prato e amarre com o cordão de palha de milho seca, apertando bem (sem espremer, é claro). No começo parece difícil e certamente vai precisar de ajuda para encher e amarrar. Mas depois de umas três ou quatro já se consegue fazer tudo sem auxílio. De qualquer forma, pamonha é gostoso fazer em mutirão.
7. Enquanto vai fazendo, já vá colocando os pacotinhos numa panela grande com água fervente. Quando todas estiverem lá, forre a superfície da panela com palha verde e cubra com sabugos até formar uma tampa. Isto vai ajudar a cozinhar de forma homogênea e evitar que as pamonhas boiem. Elas estarão prontas quando a palha começar a ficar amarelada. Para confirmar, abra uma e veja se está firme. Levam cerca de 45 minutos para ficarem boas.

Rendimento: 32 pamonhas (com cerca de 125 gramas)




As espigas da esquerda estão inguirins - espigas mal granadas, mal maduras, aguadas. Não servem para pamonhas mas ficam deliciosas refogadas. Próximo post.



A espiga passada no ralador retém a parte fibrosa mais dura, que não deve ir para a massa. Esta é a justificativa dos defensores deste modo tradicional em vez dos moedores elétricos e liquidificadores.



É meu pai, Seu Toninho, quem diz se a pamonha ficou boa ou não. Aí me mostrando o jeito certo de ralar (eu estava deixando um grãozinhos pra trás).


Suzana, minha irmã, mostrando como se raspa a espiga para aproveitar todo o germe.

Os tais três dedos para prender a emenda.



A dobra fechando a parte de cima. Se não tiver palha seca para o amarilho, use barbante de algodão.

Use uma concha ou xícara para encher as bolsinha. Este dedinho me persegue....




Coloque todas as pamonhas numa panela com água fervente.



Cubra a panela com palhas verdes e com os sabugos bem raspados.



Faça o cafezinho de coador e...


Veja também aqui no Come-se
Pamonhas do Vale-do-Paraíba
Degustação de pamonhas no Slow Food Piracicaba
Pamonhas dos Guarani

terça-feira, 25 de março de 2008

Há erva e ervas - filme Estômago



Acabei de ver um Curta ótimo, no Youtube, derivado de uma das cenas excluídas do filme Estômago, do qual já falei aqui. Vale a pena conferir.

Minimilhos, mini indian corn – em se plantando tudo dá.


Os minimilhos e um amarelo, comum.

Já faz um tempo que publiquei aqui foto dos minimilhos índios coloridos que a Fernanda, do blog Chucrute com Salsicha, me mandou dos Estados Unidos. Plantei-os no sítio, em Fartura-SP, mas havia lá um boizinho que entrava na roça na calada da noite, por algum buraco na cerca que só ele conhecia, e complementava a dieta com brotos tenros e verdinhos de pés de milho estrangeiro. Conseguimos salvar três espiguinhas que vão virar novas mudas e quem sabe daqui a um tempo teremos uma produção significativa.

Estes, os originais que a Fernanda me mandou. Eram mais fininhos e maiores.

Sorte que ela me mandou recentemente mais sementes, entre elas mais milhinhos índios. Serão todos plantados em Fartura.
Olhem o charme do nabo redondo branco e vermelho.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Tamarillo ou tomate de árvore


Descasquei com uma faquinha de legumes e fiz esta salada com catalonha, laranja, cebola, pimenta, tomatinho, hortelã, temperada com sal, azeite e um mínimo de suco de limão rosa e de laranja (só o sal, o azeite e a cebola não são do sítio).

Às vezes acontece, de uma hora pra outra, de a gente passar a gostar de alguma coisa a que nunca deu valor. Pois desta vez me encantei com os tamarillos ou tomates de árvore (Cyphomandra betacea) de um pé que tenho plantado em Fartura-SP. Comprei a mudinha no Posto Frango Assado da Rodovia Anhanguera, já com fruto, e levei para o sitio há uns 4 anos. A planta cresceu rápido, tem hoje uns 4 metros, e desde então não parou de frutificar. Frutos como ovos alaranjados. Tem também o vermelho sanguíneo, meu atual objeto do desejo. Acontece que, embora tenha tentado algumas receitas com ele, não me apeteceu logo no começo. E a ninguém da família. Então, durante todo este tempo os tomates laranjas ficaram para as galinhas, o chão forrado deles sempre. Muitos, e na porta de casa. Há alguns dias, Nina Horta me mostrou dois deles, que alguém lhe deu e me perguntou o nome. O desprezo era tanto que os chamei displicentemente de tomatillos, fazendo confusão com o nome das physalis mexicanas. Mas também, são todos parentes do tomate e da berinjela, família das Solanáceas. Só sei que desta vez cheguei lá olhando diferente para o tal tree tomato ou tomate francês (é originário da América do Sul, provavelmente do Peru). Descasquei, polvilhei sal e comi. Como não havia descoberto aquele sabor antes? Meio tomate, meio goiaba, meio maracujá, meio camapu, um blend, um corte dos bons. O hummm foi tão convincente que contaminou a família e logo todos estavam festejando a fartura deles a qualquer tempo, ao nosso alcance. A pele é mais firme e amarguinha que a do tomate e deve ser tirada. Já as sementes são mais duras, mas não atrapalham. E a polpa é mais cremosa e densa que a do tomate. É ainda mais perfumado, ácido e doce, sendo, portanto, mais versátil. Vai bem como legume em molhos, sopas, cremes, chutneys e saladas. Ou como fruta em sucos, compotas, sorvetes ou simples, cru, de colherinha. Mais uma coisa boa? A planta é resistente, não dá praga alguma (pelo menos a nossa é assim).

São bons quando maduros, macios.

Pode ser despelado como o tomate. Faça um corte em cruz na casca e mergulhe por 1 minuto na água fervente. Ou descascado com faquinha.

Grelhado com azeite, flor de sal, pimenta-do-reino e folhas de manjericão. Foi um teste rápido para ver se ficava bom. Nem preciso comentar. Entradinha perfeita.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Ovos com cúrcuma


Para quem comemora, Boa Páscoa!!
Cozinhei o ovo, craquelei a casca e aferventei com uma mistura de pó de cúrcuma e um pouco de bicarbonato para alcalinizar a mistura e ganhar tom avermelhado. Vou fatiar e usar na salada.
Fartura, fazer pamonha lá vou eu! Até segunda!

Nomes e preços de peixes amazônicos

Da minha viagem a Belém e Ilha do Marajó em novembro de 2007.


Pirarucu seco: Arapaima gigas


Camarões secos



Pratiqueira: Mugilidae Mugil spp


Pescada Go: Macrodon ancylodon



Dourada: Brachyplatystoma flavicans


Filhote: Brachyplatystoma filamentosum



Gurijuba: Arius parkerí. As ovas são enormes, lindas, deliciosas, mas não estão aqui. Só aparecem de vez em quando, quando fêmeas ovadas são pescadas por engano (pelo menos foi o que me disseram).



Tamuatá: Callichrhys sp.


Pescada Amarela: Cynoscion acoupa

Receita inspirada no filme Estômago – Músculo com cebolas e alecrim, com batatas douradas no azeite de urucum




Mais uma receita baseada no filme. É com um cozidinho de músculo com batatas e aroma de alecrim, sobra do almoço de brigada fora do cardápio, que Raimundo Nonato fisga pelo estômago o italiano, dono do restaurante que o contrata. Ah, se eles soubessem no que isto ia dar. Mas sem a sobra, não haveria argumento.
Eu gosto muito desta carne pelo simples motivo que muita gente a rejeita – o colágeno entranhado, que fica gelatinoso depois de cozido. E como colágeno é proteína e não gordura, trata-se de um corte magro, cheio de sabor e suculência. Adaptei uma receita de minha mãe que não cozinha junto as batatas porque roubam sabor da carne (podem ver, a batata cozida com carne fica deliciosa, já a carne e o caldo perdem sabor). Eu não gosto de juntar batatas a este tipo de prato porque acho que o cozido fica mais apurado e saboroso no outro dia. Enquanto as batatas amanhecidas ficam com gosto de marmita. Mas cebolas e cenouras vão bem, somam, contribuem. Também não gosto de juntar cebolas e pimentões para cozinhar junto com a carne porque derretem até o fim do cozimento. E gosto de senti-los. Então, só entram quando a carne já está macia.

Músculo com cebolas e alecrim, com batatas douradas no azeite de urucum


Ingredientes
800 gramas de músculo cortado em pedaços
2 colheres (chá ) de sal ou a gosto
1 pitada de pimenta-do-reino
2 dentes de alho socados
2 colheres (sopa) de azeite de urucum (azeite aquecido em fogo baixo com sementes de urucum e coado – 1 colher de sopa de grãos para 1 xícara de azeite – pode fazer com um bom óleo)
1 colher (sopa) de alecrim fresco picado
1 colher (chá) de cominho triturado
2 xícaras de água quente
12 cebolinhas (320 g)
¼ de pimentão verde em tirinhas
¼ de pimentão vermelho em tirinhas
1 cebola média em fatias
2 colheres (sopa) de salsinha picada

Para as batatas
12 batatas pequenas (600 g)
1,5 colher (sopa) de azeite de urucum
2 dentes de alho micropicado
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes, finamente picada
1 colher (sopa) de alecrim fresco picado
1 colher (chá) de flor de sal ou sal grosso triturado

Modo de fazer
A carne: tempere os pedaços de músculo com sal e pimenta-do-reino e reserve. Numa panela de pressão, doure o alho no azeite de urucum em fogo alto e junte a carne. Mexa e deixe dourar por cerca de 10 minutos. Junte o alecrim, o cominho e a água quente. Tampe a panela e cozinhe em fogo por 30 minutos contados a partir do momento em que a válvula começou a chiar. Deixe sair toda a pressão da panela, fora do fogo. Abra a panela e coloque as cebolinhas inteiras. Cozinhe com a tampa apoiada, mas sem pressão, por 10 minutos. Junte os pimentões, a cebola e metade da salsinha e cozinhe por mais 10 minutos. Prove o sal e corrija, se necessário. Se precisar, junte um pouco mais de água quente (deve restar um pouco de molho). Na hora de servir, espalhe por cima o resto da salsinha.

As batatas: descasque as batatas e cozinhe no vapor (steamer de bambu, cuscuzeira ou panelas de vapor) por cerca de 15 minutos ou até que fiquem macias, mas íntegras. Numa frigideira grande e antiaderente, aqueça o azeite e doure nele o alho, sem deixar queimar. Junte a pimenta, o alecrim e o sal. Mexa e logo em seguida coloque as batatas. Vá chacoalhando a frigideira até que as batatas fiquem todas recobertas pelos temperos e comece a dourar um pouco. Sirva com a carne.

Rende
: de 6 a 8 porções

quarta-feira, 19 de março de 2008

Receita inspirada no filme Estômago – Linguine da putavesga, ops linguine à Puttanesca



Fucei vários livros meus de cozinha italiana e cheguei a esta formulazinha básica que funcionou muito bem, de modo que agora me disciplino a segui-la, já que sempre fiz este prato meio a olho. E, claro, nem sempre dá certo. No filme, ele é feito com penne. Mas a receita popular italiana, inventada no improviso num bordel da Ilha de Ishcia e dedicada mesmo a elas, damas da noite, é feita com massa de fios longos. Foi sempre assim que fiz, com talharim, espaguete, linguine ou bavette. Mas com penne também me pareceu apetitoso.
Linguine à Puttanesca
Ingredientes
250 g de linguine ou outra massa longa
4 colheres (sopa) de azeite
2 dentes de alho amassados
1 colher (chá) de pimenta vermelha seca esmigalhada (ou uma dedo-de-moça sem sementes picada)
16 azeitonas pretas picadas em lascas (tiram-se lascas ao redor do caroço)
4 filezinhos de anchova em conserva picados
4 colheres (sopa) de alcaparras enxaguadas para tirar o excesso de sal
1 lata de tomate pelado (400 g) com seu caldo (os tomates devem ser fatiados)
2 colheres (sopa) de salsinha picada
Modo de preparo
Numa panela grande, cozinhe o macarrão em água fervente salgada até ficar al dente.
Enquanto isso, numa frigideira grande, aqueça o azeite e doure nele o alho. Junte a pimenta, a azeitona, a anchova e a alcaparra e refogue por 1 minuto. Coloque o tomate e seu suco e deixe cozinhar até formar um molho espesso. Prove e corrija o sal, se necessário. Junte a salsa. Escorra o macarrão e misture ao molho. Na hora de servir, nada de queijo. Apenas uma rodada de pimenta-do-reino.
Rende: 4 porções
O molho pronto.